quarta-feira, 31 de julho de 2013

Antes do samba: o maxixe.


O maxixe foi um gênero musical brasileiro que surgiu em meados do século XIX, na cidade do Rio de Janeiro, como abordam alguns autores que se dedicaram ao tema, dentre eles José Ramos Tinhorão, Jota Êfege, Marcos Napolitano, Carlos Sandroni, José Geraldo Vinci de Moraes. O maxixe, como observou Crevelanti.

se formou através da influência de vários gêneros importados da Europa, e foi por meio dos músicos nacionais, do negro escravo e ex-escravo, dos imigrantes e de seus descendentes e pessoas que aqui viviam, que fizeram parte deste processo de formação, que ela foi se consolidando pela absorção de várias características.(CREVELANTI,  2009, p.128)

As primeiras notícias sobre o maxixe datam das décadas de 1870 e 1880, Marcado por um requebrado forte, pela sensualidade e intimidade do corpo, o maxixe saiu das casas populares do bairro da Cidade Nova, para os clubes carnavalescos, teatro de revista e posteriormente, no início do século XX, chega a Paris como uma dança e música brasileira de sucesso. Durante seu desenvolvimento o maxixe enfrentou diversas rejeições e preconceitos Apesar disto, ele alcançou sucesso entre diferentes camadas sociais e para este sucesso, como observou Crevelanti, ”o teatro musicado foi imprescindível”, pois ele foi 

principal veículo de propagação da dança excomungada, onde sua dança era permitida. O maxixe, com suas características de ironia, alegria, brejeirice, malícia... agradava muito o público, não só pelas suas letras de duplo sentido como pelos movimentos dos passos sensuais e provocantes, bem como pelo seu ritmo sincopado peculiar. Nos seus palcos, criou-se a possibilidade de se desenvolver um rico processo de aculturação da Música Popular Brasileira, onde se tocavam além das músicas européias abrasileiradas, as novas criações através de gêneros nacionais. CREVELANTI, 2009, p.128)

Uma dança considerada de baixa categoria, ritmo saltitante e passos que causavam aversão aos defensores dos bons costumes, o maxixe surge, de acordo com alguns autores, na segunda metade do século XIX e provocando sentimentos ambíguos como encantamento, indignação e alegria.
O século XIX é marcado pela difusão de novos ritmos e com novas formas de dançar resultantes das misturas culturais existente neste contexto. Referindo-se a essa combinação Marcílio (2009, p. 51) citando as palavras de Mário de Andrade, expõe que havia uma dificuldade em encontrar uma música no Brasil autenticamente brasileira. Porém é com base nesta sincronia que a música popular no Brasil adquiriu um diferencial através do ritmo, da melodia e da dança.  Estas danças populares no decorrer dos anos vão se distanciando da formalidade das danças europeias e adquirem características próprias com passos que levavam seus dançarinos a ficarem mais próximos (MARTINS, 2007, p. 3).
Nos últimos anos deste mesmo século difundido essas novas práticas culturais ocorreriam à abertura de inúmeros teatros, cafés-concerto, cafés-dançantes, chopes-berrantes e cinemas, isso direcionados para a classe média da sociedade fluminense; porém, também ocorria um aumento dos locais de divertimentos destinados a população menos favorecidas. Um dos locais bastante freqüentados não apenas por essa classe baixa eram os bares e casas da Cidade Nova (MOURA, 1995, p. 105). É neste espaço de acordo com Tinhorão (1975, p. 56-57) e Jota Efegê (1974, 48) que surge um dos estilos musicais, o maxixe, que seria inicialmente desprezado, considerado imoral posteriormente conquistando as elites brasileiras a ponto de ultrapassar as fronteiras do Brasil, onde encontrou sucesso.
Sua coreografia, não apresentava uma forma marcada ou rígida de dançar, mas proporcionava em uma só dança, a forma de dançar dos negros e a organização da dança européia (SANDRONI, 2001, p.68). Com seus passos, revelavam uma paixão, animação, curiosidade e outros sentimentos que faziam com que fosse este estilo a ser considerado o mais novo aspecto que definiria o nacional, (JOTA EFEGÊ, 1974, p. 52). Para expor a dança, o autor cita uma descrição feita por Duque.

O cavalheiro e a cavalheira abraçam-se com vontade, cara com cara, corpo com corpo, o braço esquerdo dele e o direito dela esticados e lá suam a remelexar ou pelo antigo ou pelo moderno.
Pelo moderno é outro anseio. O movimento dos pés é o da polca francesa, em passos mais largos. Quando o maxixeiro dá o passo para diante, abaixa o ombro esquerdo, curvando–se pela cinta, e a maxixeira o imita: no outro passo, erguem-se os dois como uma ponta de gangorra, e assim se vão.
De quando em quando, rodopiam para a esquerda em voltas vertiginosas tão rápidas que dão, a quem aprecia, a impressão de que os dois vão cair, não se poderão sustentar naquele doido girar-girar.
Isso tudo, porém, é feito com graça, com suavidade nos meneios, com flexuosidade nos coleios... (EFEGÊ, 1974, p. 52-54).


É possível ver essa intimidade e volteios nas figurações expostas abaixo retiradas do livro “Maxixe – A dança excomungada” de Jota Efegê (1974, p. 53) reproduzidas da Revista Século XX, maio de 1906. Além da proximidade são demonstrados os passos característicos da dança.[1]



Partindo para a questão do maxixe música, que ao que parece ocorre somente no início do século XX, pode-se dizer que suas letras apresentavam a mesma característica maliciosa da dança. Conforme relata Marcilio as músicas eram criadas para que o público aprendesse com facilidade. Alguns intérpretes e compositores utilizavam de suas criações nos Teatros de Revista, este teve um papel importante na difusão do maxixe sendo o primeiro maxixe apresentado no ano de 1884 o “Aí Cara-Dura” (CREVELANTI, 2009, p. 52)
A trajetória desta música e dança “excomungada” até sua aceitação pelas elites da sociedade foi o que procuramos relatar aqui. Foi possível notar, através das leituras realizadas, que não existe uma, mas várias histórias que podem ser contadas sobre o maxixe. Mas mesmo que estas histórias apresentem diferenças alguns pontos em comum podem ser nelas observados, Um deles é que o maxixe, como outras manifestações musicais urbanas, é resultado de uma mistura de ritmos, gêneros e sons. E um segundo é de como o preconceito com o maxixe esteve relacionado com o espaço geográfico no qual ele apareceu e às pessoas que o dançaram, geralmente pobres e descendentes de ex-escravos. Foi este preconceito que segundo Adriana Fernandes, fez com que a apresentação do maxixe no Palácio da República, pela primeira dama do país, D. Nair de Teffé, provocou a indignação do então senador Rui Barbosa que teria dito ser o acontecido:

Uma dupla afronta para a diplomacia [...]. Primeiro, porque o Corta-Jaca era popularíssimo na época, e o Catete deveria dar, pelo contrário, demonstrações de refinamento e distinção. Segundo, por que foi tocado em um instrumento relacionado aos boêmios e malandros, o violão (FERNANDES, 1995, p. 191).

Os preconceitos em relação às manifestações culturais ligadas às parcelas mais pobres da sociedade ainda são muito presentes no Brasil. Mas os que os estudos sobre História e Música no Brasil vêm mostrando, como observa Vinci de Moraes, é que

O vício de isolar as tradições eruditas e populares da música e manter a rigidez dos gêneros – ainda fortemente disseminado – hoje não faz mais sentido, e a historiografia vem percorrendo novos caminhos para empreender uma história cultural da música (VINCI DE MORAES, 2010, p.1).




[1] Para ver a dança do maxixe visite o site: http://www.youtube.com/watch?v=9RhdcgPZ-x0








BIBLIOGRAFIA

BAIA, Silvano Fernandes. A historiografia da música popular no Brasil (1971 – 1999) São Paulo, 2010. Disponível em:

CREVELANTI, Carla Marcilio: Chiquinha Gonzaga e o Maxixe: A nacionalização da musica popular brasileira, São Paulo, Dissertação de Mestrado, UNESP, 2009.

CREVELANTI, Carla Marcilio: Chiquinha Gonzaga e o Maxixe. São Paulo. 2009.


GUERRA PEIXE. Variações sobre o Maxixe. Jornal O Tempo. São Paulo 26/09/1954. Disponível em:
EFEGÊ, Jota: Maxixe: a dança excomungada, Rio de Janeiro Conquista, 1974

NAPOLITANO, Marcos: História e música – história cultural da música popular. 3° ed. Belo Horizonte MG, Editora Autêntica, 2005.

                                      História e música popular: um mapa de leituras e questões. Revista de História,  n.157, São Paulo,  USP, 2007. Disponível em:

TINHORÃO, José Ramos, Pequena História da musica popular: da modinha a canção de protesto, Rio de Janeiro, Editora vozes, 2° Ed, 1975.

                                              História Social da música popular brasileira, São Paulo, Ed.34, 1998.

                                         A música popular no romance brasileiro: Século XX, São Paulo, Ed.34, 2002.


VELLOSO Mônica Pimenta. A escrita e a dança: Uma genealogia literária da nacionalidade. Revista Rio de Janeiro, n. 20-21, jan.-dez. FCRB, 2007.

                                   “É quase impossível falar de homens que dançam” Representações sobre o nacional - popular.  USP.  Fênix – Revista de História e Estudos Culturais Outubro/ Novembro/ Dezembro de 2007 Vol. 4 Ano IV nº 4
Disponível em: <http://www.forumrio.uerj.br/documentos/revista_20-21/Cap-12-Monica_Velloso.pdf>             Acesso em 15 nov. 2011

VINCI DE MORAES, José Geraldo. Modulações e novos ritmos na oficina da História, USP, 2005. Disponível em:

                                     História e música: História Cultural da música popular, Belo Horizonte, Editora Autentica, 2005.

 



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